Para além das fórmulas

O professor era de matemática, do 1º ano do Ensino Médio. Final de fevereiro, a turma entre 15 e 16 anos, aquele burburinho da semana inicial de aulas, embalado pelo calor vivo das experiências do verão, que ainda custaria a acabar. Novo na escola, ele entrou na sala junto com os mais de 30 alunos, após o sinal anunciar o final do intervalo.
Arrumou seu material sobre a mesa disposta em cima do estrado, ironicamente chamado de palco, enquanto cada um tentava caber em sua cadeira e classe. Ele agia com tranquilidade, como se o tempo estivesse paralisado e os números não fossem os carrascos do currículo escolar e das exigências de desempenho. Isso apavorava a maioria da turma e talvez a perspectiva de uma prova surpresa tenha começado a espalhar um silêncio temeroso, que contagiou um a um em questão de segundos.
Ele sentou-se na sua cadeira, retirou o caderno de presença da pasta e, sem dizer bom dia, começou a chamada por ordem alfabética. Lia nome e sobrenome com reverência, levantava a cabeça para localizar de onde vinha o “presente” e fixava bem o olhar em cada aluno. Ele quer memorizar o rosto de cada um, pensaram os mais observadores. Apenas mais tarde saberiam que ele enxergava muito além do comprimento dos cabelos e da cor dos olhos. A chamada que, em média, acontecia em poucos minutos, com ele se multiplicou por cinco.
Ninguém se atrevia a demonstrar impaciência, passar bilhetinhos ou fazer desenhos de corações na última folha do caderno.
Finalizado esse momento, ele desceu do estrado e foi até o meio da sala, obrigando toda a turma a se acomodar em uma posição circular. Criou suspense com uma seriedade que levava a pensar em alguma notícia que exigia preparação de espírito. De certa forma, era isso mesmo, porque nunca tinham ouvido nada parecido com o que ele disse a seguir:
“Prestem bem atenção. Quero desde já fazer uma combinação com vocês.”
Ninguém respirava.
“Se por acaso os namoros estiverem atrapalhando os estudos, é muito simples: larguem os estudos!”
A gargalhada foi geral e não precisou finalizar o trimestre para todos saberem que não haveria uma falta sequer àquelas aulas.

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